Machado de Assis

Memórias Póstumas de Brás Cubas


Gênero

A crítica considera Memórias Póstumas de Brás Cubas o romance que introduziu o Realismo na literatura brasileira. De fato, ao lado de outras obras como Ocidentais (1882), Histórias sem Data (1884), Várias Histórias (1896) e Páginas Recolhidas (1899), este livro foi também um divisor de águas na própria obra de Machado de Assis, aquele que iniciou a sua carreira madura, como o próprio autor reconhece na citação ao lado numa reedição tardia de Helena.

O gênero é realista por criticar com ironia e pessimismo as condições da época, no entanto não está isento de resíduos românticos presentes nos romances, nas paixões e nos amores de Brás Cubas, ainda que o sonho de relações e casamentos perfeitos e a tensão bem x mal, herói x vilão-situações tão convencionais à ficção romanesca-não exista e as personagens ajam calculadamente por interesse na obtenção de " Status social ", na ascensão social através do casamento, como quando o pai de Brás quer que ele se case com Virgília, filha do Conselheiro Dutra, político proeminente. E mesmo assim, Machado não compactua com o esquematismo determinista dos realistas, nem procura causas muito explícitas ou claras para a explicação das personagens e situações. O fato do narrador tentar relatar suas memórias e recriar o passado faz com que o romance também se enquadre em certos elementos do romance impressionista.

Dois outros gêneros significativos em Memórias Póstumas são as antecipações modernas da obra-a estrutura fragmentária não-linear, o gosto pelo elíptico e alusivo e a postura metalinguística de quem escreve e se vê escrevendo (Brás Cubas no início declara explicitamente basear-se em Laurence Sterne). O outro elemento, a fantasia, é encontrada em duas situações: Brás Cubas, mesmo morto e enterrado, ainda assim escreve sua autobiografia e, no Capítulo VII, tem um delírio em que viaja montado num hipopótamo e encontra-se com Pandora, que é interpretado como uma forma de mostrar que o ser humano nada mais é do que um verme diante da Natureza. De fato, certos autores referem-se a esta obra como "a primeira narrativa fantástica do Brasil". O caráter fantástico e realista, cômico e sério, e que também mistura cartas e novelas a uma trama global, além de não haver nenhum enobrecimento dos personagens e de suas ações, deu margem a José Guilherme Merquior escrever que o verdadeiro gênero de Memórias Póstumas de Brás Cubas seria o cômico-fantástico, também conhecido como literatura menipéia.

Memórias Póstumas de Brás Cubas marca um momento no cenário literário nacional em que Machado de Assis rompe com duas tendências literárias dominantes de seu tempo: a dos realistas que seguiam a teoria de Flaubert, do "romance que narra a si próprio" e que apaga o narrador atrás da objetividade da narrativa; e a dos naturalistas que, na esteira de Zola, pregavam o "inventário maciço da realidade", observada nos menores detalhes. Ao invés disso, Machado de Assis constrói um livro em que cultiva o incompleto, o fragmentário, intervindo na narrativa para conversar diretamente com o leitor e comentar o próprio romance e suas personagens e fatos.

Tornou-se comum atribuir à leitura do livro um caráter de diversão e prazer por detrás de sua perspectiva desencantada. Entre seus traços, destacam-se os do universalismo, psicologismo, de arquétipos e o uso de um estilo "enxuto" por primar "pelo equilíbrio, pela disciplina clássica, pela correção gramatical e pela concisão, pela economia vocabular". Assim, Machado seria sóbrio e parcimonioso, ao contrário de Castro Alves, José de Alencar e Rui Barbosa que abusariam imoderamente do adjetivo e do advérbio. De fato, Francisco Achcar escreve que o livro é sem vocabulário difícil e que "alguma dificuldade que pode ter um leitor de hoje se deve ao fato de que certas palavras caíram em desuso". A linguagem de Memórias Póstumas de Brás Cubas, contudo, não é simétrica e mecânica, mas possui um ritmo.

O livro é permeado por intertextualidade e ironias. O segundo recurso logo nota-se na "Dedicatória" de Brás Cubas ao verme que primeiro roeu as frias carnes do meu cadáver. A ironia é vista como uma forma de "revolta pela vida" usada por Machado para fazer rir, quando como por exemplo Brás Cubas escreve: a sabedoria humana não vale um par de botas curtas [...] Tu, minha Eugênia, é que não as descalçaste nunca à personagem que era coxa de nascença, num célebre exemplo de humor negro. O primeiro recurso, por sua vez, refere-se às referências machadianas aos estilos de outros grandes autores do Ocidente: "Na maioria dos casos, essas referências são implícitas, só podem ser percebidas por leitores familiarizados com as grandes obras da literatura."Brás Cubas, por exemplo, refere-se no início do livro à Xavier de Maistre e depois a obras como a Suma Teológica. Por conta disso os críticos notam que o estilo machadiano é "culto" por "fazer uso da cultura e sua compreensão aprofundada exige cultura da parte do leitor ". Para saber mais sobre as intertextualidades no livro, vá à seção Influências literárias abaixo.

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